Demissões e privatização:
o que está por trás do suposto déficit
nos Correios
Rede Brasil Atual
09/04/2017
09/04/2017
Fundada em 1663, a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos
(ECT), uma das mais antigas do país, vive no governo do presidente golpista,
Michel Temer, a pior fase de sua história. A direção da estatal alega um
déficit acumulado de mais R$ 4 bilhões nos últimos dois anos para impor uma
agenda de reestruturação, que passa pela demissão de milhares de funcionários e
o fechamento de mais de mais de 250 unidades próprias em todo o país.
O Plano de Demissão Voluntária (PDV) da
estatal, lançado no começo deste ano, obteve a adesão de 5,5 mil empregados; a
meta inicial era atingir oito mil. Por causa disso, a direção dos Correios
estuda adotar um plano de demissão motivada, que poderia atingir funcionários
concursados, mesmo que eles não queiram pedir desligamento da empresa.
A medida é polêmica e, se for levada adiante,
abrirá precedente para demissão unilateral de funcionários concursados em
diversas empresas públicas federais. Os Correios possuem 117 mil empregados e
mais de 6.400 agências próprias, além de outras mil conveniadas. A estatal
entrega por dia, em média, mais de 30 milhões de correspondências e encomendas
em todo o país.
Déficit?
A principal justificativa para o resultado
negativo nas contas dos Correios é o aporte para financiar o plano de saúde dos
funcionários. Do total de R$ 2,1 bilhões em prejuízos apurados em 2016, cerca
de R$ 1,6 bilhão seria apenas referente à alocação de gastos para o plano de
saúde. Ocorre que a maior parte desse gasto, na verdade, é uma projeção
contábil da empresa para manter o benefício do pós-emprego, ou seja, o plano de
saúde dos aposentados.
"A empresa, há cerca de três anos, mudou
seu balanço contábil para incluir uma dívida futura com o plano de saúde, com
base em estimativas da expectativa de vida dos aposentados. Os Correios não têm
que desembolsar esse recurso agora, mas estão usando esse argumento para pedir
um sacrifício aos seus trabalhadores, prejudicando o atendimento ao
público", aponta José Rivaldo da Silva, secretário-geral da Federação
Nacional dos Trabalhadores em Empresas de Correios e Telégrafos e Similares
(Fentect).
O ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações
e Comunicações, Gilberto Kassab, afirmou na semana passada que os Correios
terão que fazer "cortes radicais" de gastos para evitar a
privatização e que o governo federal não vai aportar nenhum recurso na empresa.
Segundo sindicatos e a federação dos trabalhadores dos Correios, no entanto, o
governo deve pelo menos R$ 6 bilhões aos Correios por conta de repasses
indevidos da estatal ao Tesouro Nacional ao longo dos últimos anos.
A "ameaça" de privatização vem
sendo repetida pelo presidente da companhia, Guilherme Campos, que trava uma
batalha sem precedentes com os empregados da empresa para cortar gastos e
benefícios. Além da mudança no plano de saúde, com elevação da cota paga por
cada empregado, o presidente dos Correios suspendeu as férias dos funcionários
até abril de 2018.
Poderosos interesses
Apesar de insistir na tese de privatização
caso a estatal não equilibre as contas, o próprio presidente dos Correios
admite que esse seria o pior momento para a uma operação dessa natureza.
"O ativo está muito depreciado e sua avaliação atual está bem abaixo de
seu valor real", declarou Guilherme Campos em recente entrevista.
Investidores estimam que os Correios poderiam
valer de R$ 3 a R$ 5 bilhões, apesar de sua receita anual ultrapassar os R$ 18
bilhões. Dessa receita total, mais de 54% provêm de serviços exclusivos que só
a empresa opera por deter o monopólio do setor no país. A quebra desse
monopólio por meio da privatização poderia atrair gigantes de outros países,
como as norte-americanas Fedex e DHL.
Além da entrega de cartas, correspondências e
encomendas, os Correios conduzem grandes operações logísticas, como a
distribuição de livros didáticos e das provas do Enem. Presente em todos os
municípios do país, a empresa ainda é responsável pela inclusão bancária de
milhões de brasileiros, por meio do Banco Postal, única instituição financeira
presente em mais de 1.600 municípios do país. "Nós sabemos que o capital
privado não tem interesse nos pequenos municípios, onde o volume de negócios é
pequeno. Ficariam com o chamado filé e abandonariam o atendimento nas regiões
periféricas", afirma a deputada Maria do Rosário (PT-RS), em artigo
recente.
Ela ressalta que a privatização dos serviços
de correios não é uma tendência mundial e poucos países permitem isso.
"Dos 192 correios do mundo, só oito estão 100% privatizados e outros 11
contam com participação acionária da iniciativa privada".
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