O erro repetido
O GLOBO
COLUNA MIRIAM LEITÃO
25/4/17
Está acontecendo com a reforma da Previdência de Temer o que aconteceu com todas as outras. As pressões corporativas aumentam, o governo cede em partes, e cada vez há mais concessões a fazer.
Depois, o governo decide que qualquer reforma é melhor do que nenhuma. Até o último momento os defensores de grupos de interesse vão tirando nacos do projeto. No fim, é aprovado um conjunto disforme e ineficiente.
A decisão do governo de fazer uma reunião no fim de semana para interromper a escalada das concessões é boa, mas pode ser insuficiente. O rolo compressor já começou e ele não vai parar. Uma das estratégias é tentar adiar para ver se assim aumenta a chance de aprovação do projeto. Pode ser mais um risco estratégico.
Desde o começo o governo perdeu a batalha da comunicação. Claro que é muito mais agradável ouvir a tese de que não há déficit. Se o problema não existe, não há com o que se preocupar. Recentemente, num debate, uma jovem de uma das favelas do Rio me perguntou sobre a inexistência do déficit. A teoria que ela repetiu é que se somarmos todos os impostos da seguridade não haverá déficit.
O curioso é que a jovem em questão, inteligente e de apenas 25 anos, trabalha, mas não vai se aposentar precocemente por vários motivos. Ela não está no mercado formal e, por isso, não está contando tempo de contribuição. Quando for a vez dela, a idade mínima pode até ser maior do que os 62 e 65 anos. Quem ganha com a informação falsa de que o déficit não existe são os que têm a proteção que não estará disponível para ela. A pergunta bem formulada mostra que os defensores da tese foram eficientes. E o governo não conseguiu neutralizar essa campanha. Não conseguiu mostrar como é injusta a proposta dos adversários da reforma de que todos os impostos que existem para cobrir a saúde e os programas sociais sejam dirigidos para financiar o sistema de pensão e aposentadoria, no qual os que ganham mais se aposentaram mais cedo.
O governo capitulou desde o primeiro momento quando deixou as Forças Armadas de fora. Daí em diante, foi criando exceções para grupos e profissões. Depois, diminuiu a idade mínima da mulher, apesar de só POSTALIS começar a valer apenas daqui a 20 anos.
O risco da reforma é ser fraca demais e não ser capaz de solucionar o problema. Funcionários receberem o salário integral quando se aposentam e ainda terem reajustes do mesmo percentual dos da ativa é um peso insustentável para as contas públicas. Ao longo do tempo foram criadas algumas barreiras a essas duas prerrogativas. Mas o fato é que o funcionalismo público federal tem um déficit de R$ 77 bi, apesar de serem apenas um milhão de beneficiários. Do ponto de vista relativo, é o déficit mais alto do Brasil.
Os funcionários de estatais sempre tiveram o privilégio de ter o governo poupando em seu nome. Durante anos, o Tesouro aplicou nos grandes fundos de pensão um valor muito maior do que o aportado pelos beneficiários. Agora, uma parte desse sistema de aposentadoria, capitalizado pelo dinheiro público, está ameaçado pelos erros cometidos nos governos do PT de impor aos fundos das estatais investimentos em projetos que não deram retorno. O “Estadão” publicou na edição de ontem que o déficit atuarial dos fundos chegou a R$ 70 bilhões. Era R$ 9 bilhões em 2012. Projetos e parcerias como Sete Brasil, Invepar, Oi, hidrelétricas da Amazônia jogaram prejuízo sobre os fundos. Em alguns casos, houve desvio diretamente, como o que atingiu a Postalis. Funcionários dos Correios que se aposentam agora estão sendo obrigados a contribuir com 30% do que ganham para reequilibrar o fundo.
Não há um problema da Previdência, há vários. Há o desequilíbrio do INSS, o déficit dos servidores federais, o rombo dos servidores estaduais. Isso tudo somado é um buraco de mais de R$ 300 bilhões por ano. O déficit dos fundos de pensão é outro problema que exigirá recursos das empresas públicas.
Normalmente, a patrocinadora e os beneficiários dividem a conta do fiasco.
É claro que o governo tem que fazer algo mais do que a reforma, como cobrar as dívidas com o INSS, como as do JBS por exemplo. E tem que rever os abusos das isenções previdenciárias. Mas é irresponsabilidade com o futuro defender grupos de interesse em vez de olhar a necessidade do país em assunto tão grave.
Mas é o que está acontecendo neste momento. E, nesse olhar para os interesses particulares, o Congresso está perdendo a visão de conjunto.
O GLOBO
COLUNA MIRIAM LEITÃO
25/4/17
Está acontecendo com a reforma da Previdência de Temer o que aconteceu com todas as outras. As pressões corporativas aumentam, o governo cede em partes, e cada vez há mais concessões a fazer.
Depois, o governo decide que qualquer reforma é melhor do que nenhuma. Até o último momento os defensores de grupos de interesse vão tirando nacos do projeto. No fim, é aprovado um conjunto disforme e ineficiente.
A decisão do governo de fazer uma reunião no fim de semana para interromper a escalada das concessões é boa, mas pode ser insuficiente. O rolo compressor já começou e ele não vai parar. Uma das estratégias é tentar adiar para ver se assim aumenta a chance de aprovação do projeto. Pode ser mais um risco estratégico.
Desde o começo o governo perdeu a batalha da comunicação. Claro que é muito mais agradável ouvir a tese de que não há déficit. Se o problema não existe, não há com o que se preocupar. Recentemente, num debate, uma jovem de uma das favelas do Rio me perguntou sobre a inexistência do déficit. A teoria que ela repetiu é que se somarmos todos os impostos da seguridade não haverá déficit.
O curioso é que a jovem em questão, inteligente e de apenas 25 anos, trabalha, mas não vai se aposentar precocemente por vários motivos. Ela não está no mercado formal e, por isso, não está contando tempo de contribuição. Quando for a vez dela, a idade mínima pode até ser maior do que os 62 e 65 anos. Quem ganha com a informação falsa de que o déficit não existe são os que têm a proteção que não estará disponível para ela. A pergunta bem formulada mostra que os defensores da tese foram eficientes. E o governo não conseguiu neutralizar essa campanha. Não conseguiu mostrar como é injusta a proposta dos adversários da reforma de que todos os impostos que existem para cobrir a saúde e os programas sociais sejam dirigidos para financiar o sistema de pensão e aposentadoria, no qual os que ganham mais se aposentaram mais cedo.
O governo capitulou desde o primeiro momento quando deixou as Forças Armadas de fora. Daí em diante, foi criando exceções para grupos e profissões. Depois, diminuiu a idade mínima da mulher, apesar de só POSTALIS começar a valer apenas daqui a 20 anos.
O risco da reforma é ser fraca demais e não ser capaz de solucionar o problema. Funcionários receberem o salário integral quando se aposentam e ainda terem reajustes do mesmo percentual dos da ativa é um peso insustentável para as contas públicas. Ao longo do tempo foram criadas algumas barreiras a essas duas prerrogativas. Mas o fato é que o funcionalismo público federal tem um déficit de R$ 77 bi, apesar de serem apenas um milhão de beneficiários. Do ponto de vista relativo, é o déficit mais alto do Brasil.
Os funcionários de estatais sempre tiveram o privilégio de ter o governo poupando em seu nome. Durante anos, o Tesouro aplicou nos grandes fundos de pensão um valor muito maior do que o aportado pelos beneficiários. Agora, uma parte desse sistema de aposentadoria, capitalizado pelo dinheiro público, está ameaçado pelos erros cometidos nos governos do PT de impor aos fundos das estatais investimentos em projetos que não deram retorno. O “Estadão” publicou na edição de ontem que o déficit atuarial dos fundos chegou a R$ 70 bilhões. Era R$ 9 bilhões em 2012. Projetos e parcerias como Sete Brasil, Invepar, Oi, hidrelétricas da Amazônia jogaram prejuízo sobre os fundos. Em alguns casos, houve desvio diretamente, como o que atingiu a Postalis. Funcionários dos Correios que se aposentam agora estão sendo obrigados a contribuir com 30% do que ganham para reequilibrar o fundo.
Não há um problema da Previdência, há vários. Há o desequilíbrio do INSS, o déficit dos servidores federais, o rombo dos servidores estaduais. Isso tudo somado é um buraco de mais de R$ 300 bilhões por ano. O déficit dos fundos de pensão é outro problema que exigirá recursos das empresas públicas.
Normalmente, a patrocinadora e os beneficiários dividem a conta do fiasco.
É claro que o governo tem que fazer algo mais do que a reforma, como cobrar as dívidas com o INSS, como as do JBS por exemplo. E tem que rever os abusos das isenções previdenciárias. Mas é irresponsabilidade com o futuro defender grupos de interesse em vez de olhar a necessidade do país em assunto tão grave.
Mas é o que está acontecendo neste momento. E, nesse olhar para os interesses particulares, o Congresso está perdendo a visão de conjunto.
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