Em 2016, número de
quarentenas bate
recorde
Estadão
15/08/2016
15/08/2016
BRASÍLIA - A Comissão de Ética Pública da
Presidência da República concedeu no primeiro semestre deste ano um número
recorde de quarentenas. Levantamento obtido pelo Estado por meio da Lei de
Acesso à Informação revela que, de janeiro a junho, 65 ex-integrantes do
governo da presidente afastada Dilma Rousseff tiveram autorização para
continuar recebendo os salários por seis meses sem trabalhar, com a condição de
que não fossem para a iniciativa privada. O número é maior do que as 62
concessões dadas em 2015 inteiro e mais do que o triplo do permitido no ano
anterior.
Em 2011, quando o governo Luiz Inácio Lula
da Silva deu lugar à gestão Dilma, foram 11 pedidos de quarentena
aceitos.
Não há um valor total de salários pagos
neste período, mas na lista dos favorecidos estão 17 ex-ministros do segundo
mandato de Dilma, além de ex-secretários executivos (número 2 de um ministério)
e presidentes de estatais, como Correios,
Caixa e BNDES. Cada um dos ex-ministros recebe R$ 30,9 mil por mês e os
ex-secretários executivos, R$ 29,3 mil.
Já os salários de ex-presidentes de
estatais variam, de R$ 46 mil (Giovanni Queiroz, dos Correios) a R$ 123 mil
(Aldemir Bendine, da Petrobrás).
Na Caixa, além de Miriam Belchior (R$ 53,3
mil), outros integrantes da direção continuaram recebendo os vencimentos. Entre
eles estava Fábio Cleto, ex-vice-presidente do banco que, em delação premiada à
força-tarefa da Lava Jato, detalhou um esquema de propina para captar recursos
do FI-FGTS. O fundo de investimento que usa uma parte do FGTS dos trabalhadores
para aplicar em infraestrutura foi usado, segundo Cleto, para desviar verba
para um esquema ligado ao deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Cunha
nega.
Pedidos. Segundo a Comissão de Ética
Pública da Presidência, desde o fim do ano passado foram feitos 213 pedidos de
quarentena, dos quais 102 foram recusados e 5 arquivados. O restante foi
concedido ou ainda tramita.
A concessão do benefício é prevista na
legislação brasileira para evitar conflito de interesse de quem sai de um cargo
público e vai para a iniciativa privada. O objetivo é evitar que essas pessoas
usem informações privilegiadas de quando estavam no alto comando da
administração federal. Servidores públicos, como o ex-número 2 do Ministério da
Educação Luiz Claudio Costa, também têm direito ao benefício.
Entre os ex-ministros estão Jaques Wagner
(Casa Civil), Nelson Barbosa (Fazenda), Aloizio Mercadante (Educação), José
Eduardo Cardozo (AGU), Miguel Rossetto (Trabalho e Previdência), Valdir Simão
(Planejamento), Ricardo Berzoini (Governo), Izabella Teixeira (Meio Ambiente),
Inês Magalhães (Cidades), Tereza Campelo (Desenvolvimento Social), Carlos Gabas
(Aviação Civil), Aldo Rebelo (Ciência e Tecnologia), Juca Ferreira (Cultura) e
Eleonora Menicucci (Secretaria Especial para Mulheres).
Jorge Rodrigo Araújo Messias, o “Bessias”,
citado em conversa telefônica interceptada pela Polícia Federal entre Dilma e
Lula, também pediu quarentena, mas depois retirou a solicitação quando assumiu
o cargo de assessor da presidente afastada no Palácio da Alvorada.
Impeachment e lei. O presidente da Comissão
de Ética, Mauro de Azevedo Menezes, disse que o recorde de concessões neste ano
se deve, além do afastamento de Dilma do cargo, à ampliação do rol de
autoridades com direito à quarentena para funcionários de confiança e presidentes,
vices e diretores de autarquias, fundações e empresas públicas ou sociedades de
economia mista.
A extensão da quarentena foi sancionada em
2013 por Dilma, depois que o projeto foi aprovado no Congresso. “Cada aprovação
de um pedido de quarentena tem muita discussão e é feita com base em muitos
critérios”, disse Menezes. “Todas as vezes que houver mudança de governo com
troca significativa de cargos, é natural que haja essa mesma proporção”,
afirmou. A próxima reunião do colegiado é no dia 22 de agosto.
Entre os pedidos indeferidos está o do
ex-presidente do Banco Central Alexandre Tombini, que deve ser o representante
do Brasil no Fundo Monetário Nacional (FMI).
Sobre a concessão do benefício a Cleto, o
presidente da Comissão de Ética afirmou que no momento da autorização não se
sabia publicamente que ele seria investigado pela Operação Lava Jato e fecharia
delação premiada. “A quarentena é imposta pelo interesse púbico de proibir que
se obtenham na iniciativa privada ganhos decorrentes do trabalho que se exercia
na função pública. Cleto admitiu que cometeu esse crime ainda no exercício do
cargo”, afirmou. “Se alguém viola a quarentena, beneficiando o interesse
privado posteriormente ou no exercício do cargo público, o Ministério Público
tem de tomar as iniciativas e incriminar.”
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