Com risco de privatização, precisamos falar sobre os Correios
Gazeta
22/09/2020
Numa eventual privatização, o Estado deixaria
de arrecadar uma boa fortuna e, ainda, com a consequente reestruturação
que importaria em demissões Os serviços são insatisfatórios, há influência
política, greves constantes e perda de mercado, isso tudo quando não há
prejuízo. Este é o discurso para privatizar os Correios, que
existem desde 1663, tornando-se empresa pública 300 anos depois. Por mais que
se concorde que o Estado não deve gerir empresas, atividade típica da
iniciativa privada, retirar do povo algo que existe antes mesmo da
República (e da própria Economia, como ciência), é uma escolha cujas narrativas
devem ser vistas com cautela, pragmatismo, desprendimento ideológico e uma
fria análise dos custos explícitos e implícitos do tradeoff.
O que determina a escolha é a preservação do
erário e o bem-estar da população (traduzindo-se em boa prestação dos
serviços). Portanto, encontrar uma solução (seja qual for), que traga
sustentabilidade empresarial e entregas confiáveis e no prazo, é o norte.
Será que a solução propagada resolve?
De início, o monopólio legal apedrejado pela
população é um despropósito. O que muitos
não sabem é que a exclusividade da lei é apenas o envio de cartas, cartões
postais e emissão de selos, um negócio em declínio, pois os meios virtuais
já substituíram a postagem de boletos e lembranças de viagem com um selo
estampado. Mas se este é o problema, basta revogar a lei.
Quanto às encomendas, se a ECT domina o
mercado, é porque oferece preços mais justos e possui alcance maior que suas
rivais. A propósito, não raro, concorrentes usam seus serviços para
entregar em locais onde não têm interesse em investir. O intento
das pretensas compradoras é adquirir o sofisticado sistema de logística a
preço infinitamente inferior que começar do zero. Não é um mercado de
livre concorrência, sempre será um monopólio ou, na melhor das hipóteses,
um oligopólio de muito poucos.
Prejuízo? Durante toda a vida da ECT, ficou no vermelho somente de 2013 a
2016 (proposital, será?). De 1999 a 2019, os Correios tiveram um lucro
anual médio de R$ 211,5 milhões. É um negócio lucrativo aos cofres
públicos. Numa eventual privatização, o Estado deixaria de arrecadar uma
boa fortuna e, ainda, com a consequente reestruturação que importaria em
demissões e PDV em massa, poder-se-ia considerar um bom gasto com
seguro-desemprego, aposentadorias e eventuais programas de transferência
de renda.
Mas os serviços são ruins! Isto não é
exclusividade de empresas públicas. Ao contrário, no ranking do Reclame
Aqui (consultado em 20/09/2020), os Correios estão em 9º lugar entre as
mais reclamadas dos últimos seis meses. As oito da frente são todas
empresas privadas. A vencedora, diga-se, é uma das interessadas em comprar
a ECT, uma companhia que conta com menos da metade dos empregados e mais
que o dobro de reclamações.
Ah, mas tem greves constantes. Ok, tem mesmo,
assim como o setor bancário e de transporte de passageiros urbano, setores
típicos da livre iniciativa. O problema aqui é de um falido sistema
sindical, cuja reforma é mais necessária que a trabalhista.
E, convenhamos, privatizar não resolve o imbróglio, pois o sindicato que
representa os trabalhadores será o mesmo.
Por fim, há muita influência política!
Correto, este é o mais grave ranço dos Correios. Enquanto os carteiros são
concursados e ralam no sol e na chuva para fazer as entregas de casa em
casa, a direção mais bem remunerada e diversos cargos de chefia são
tomadas por ocupantes de cargos de livre exoneração, nomeados por
influência política (diretores recebem mais de R$ 47 mil mensais). Bem, a
solução é votar em quem recuse essa prática e/ou aguardar que a reforma
administrativa, absolutamente essencial e urgente, acabe definitivamente
com a festa. Note-se que, mesmo sendo adepto a privatizações, os argumentos
aqui não convencem.
A influência política nos serviços é
algo maior que os Correios e invade todas as esferas da administração
pública. Não acreditar que isso pode mudar, seja nos Correios, seja
no governo, é desacreditar no futuro do país. Neste caso, talvez a melhor
sugestão seja aquela do “Maluco Beleza”: "A solução é alugar o
Brasil, nós não vamos pagar nada, é tudo free, vamo embora, dá lugar
pros gringo entrar, que este imóvel está pra alugar”. Por Cássio Moro,
juiz do Trabalho, mestre em Processo, especialista em Direito do Trabalho
e estudante de Economia.
Justiça determina fim da greve dos Correios; trabalhadores decidem na terça se voltam
TST mantém fora 50 dos 70 pontos já
cancelados pela empresa, reajuste de 2,6% e desconto de metade dos dias parados
Brasil de Fato
21/09/2020
O Tribunal Superior do Trabalho julgou nesta
segunda (21) a greve dos Correios como sendo não abusiva,
manteve a revogação de 50 das 79 cláusulas do acordo coletivo anterior - a
empresa havia revogado unilateralmente 70 delas - determinou um reajuste de
2,6% para os trabalhadores e a volta ao trabalho na terça-feira.
Mas em comunicado emitido após a decisão a
FENTECT ( Federação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de Correios e
Telégrafos e Similares) chamou seus membros a avaliarem na terça qual a
resposta.
"A FENTECT realizará pela manhã reunião
com sua diretoria para avaliação do cenário e orienta todos os seus sindicatos
filiados a manterem a realização de assembleias na tarde e noite de amanhã,
22/09, como inicialmente previsto, para que os trabalhadores possam analisar a
proposta e decidir de forma coletiva e democrática sobre o resultado do
julgamento", afirma a nota.
O TST estipulou multa diária de R$ 100 mil em
caso de descumprimento da decisão de volta ao trabalho. Os ministros deliberam
ainda pelo pagamento de metade dos 35 dias de paralisação, com a outra metade
sendo descontada dos salários.
A nota da Federação afirma que "o
Judiciário voltou a agir como porta-voz dos Correios" e que a decisão não
contempla a categoria. Em discurso, a própria relatora do processo, a ministra
Kátia Arruda, disse que a direção da estatal dificultou o processo de
negociação.“A ECT [Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos] negou-se
peremptoriamente em apresentar qualquer avanço no sentido de atender ao menos
parcialmente às reivindicações da categoria.”
“Houve uma patente conduta negativista para
negociar, como eu, com quase 30 anos de experiência da Justiça do Trabalho,
jamais tinha vivenciado. (...) E é a primeira vez em que julgamos uma matéria
em que uma empresa retira praticamente todos os direitos dos empregados”,
frisou a magistrada.
A ministra refutou ainda o argumento da
empresa de que a suspensão dos 70 pontos do ACT seria provocada por “forte
crise econômica”.
“Não há como ser acolhida essa negação da
empresa baseada em hipótese eventual e futura de restrição de fluxo de caixa,
ou seja, é mero argumento sem nenhuma comprovação. Na própria petição inicial,
a ECT reconhece [isso] fortemente, nas suas atividades, considerando inclusive
o primeiro semestre de 2020, além de lucros recorrentes há mais de três anos.
Além disso, até mesmo em razão da pandemia, o cenário é de forte crescimento do
e-commerce”, argumentou Kátia Arruda, ao mencionar um crescimento de 135% nesse
tipo de comércio no país.
A relatora ressaltou também que o julgamento
desta segunda tem caráter histórico. “Talvez, dos mais importantes que o TST já
teve que enfrentar. Penso que pelo menos nos últimos 20 anos é o mais
importante da história da ECT. A empresa tem mais de 360 anos e é, talvez, a
mais antiga da história do Brasil junto com a Casa da Moeda. E tem como
objetivos e função social a confiabilidade, a qualidade e a eficiência”, disse,
citando o estatuto da estatal e ainda a importância dos direitos dos
empregados.
*Colaborou; Cristiane Sampaio, do Brasil de
Fato em Fortaleza
Com desconto e compensação, Correios devem retomar atividades nesta terça
Conjur
21/09/2020
Depois de um mês paralisados, os Correios devem
retomar suas atividades a partir desta terça-feira (22/9), decidiu o Tribunal
Superior do Trabalho em julgamento nesta segunda-feira (21). Em caso de
descumprimento, é prevista multa diária de R$ 100 mil. A correção do salário da
categoria será em 2,60%.
Os ministros da Seção Especializada em
Dissídios Coletivos (SDC) aplicaram a jurisprudência da corte para definir que
os trabalhadores tenham metade do salário descontado e outra metade, compensada
pelos dias parados. A decisão foi por maioria, ficando vencidos a relatora, a
ministra Kátia Arruda, e os ministros Maurício Godinho e Luiz Philippe Vieira
de Mello Filho.
Godinho pontuou que, como o desconto trata de
verba salarial, ficaria muito pesado aos trabalhadores. Por isso, sugeriu que o
desconto fosse dividido em três parcelas mensais.
O julgamento foi designado pela relatora
depois de duas tentativas de solução consensual para o conflito. Em agosto, o
vice-presidente do TST, ministro Vieira de Mello Filho, se reuniu com a empresa
e as entidades sindicais representantes dos empregados e propôs a renovação das
79 cláusulas vigentes, sem reajustes nas cláusulas econômicas, o que foi
rejeitado pela empresa.
Nesta segunda, a maioria dos ministros
concordou com a divergência apresentada pelo ministro Ives Gandra da Silva
Martins Filho. Ele sugeriu manter 20 cláusulas sociais no acordo coletivo, que
asseguram direitos sociais aos trabalhadores e não geram despesas para a
empresa.
Além delas, foram acolhidas nove cláusulas
propostas pela empresa, com uma pequena redação da que trata do plano de saúde.
Cláusula 1. Plano de saúde: "A empresa poderá disponibilizar Benefício de
Assistência à Saúde por meio de operadora contratada, de adesão facultativa e
mediante cobrança de mensalidade e coparticipação dos beneficiários".
Com a mudança, onde se lê "poderá",
vai ser "deverá" disponibilizar. A medida, segundo os ministros, visa
garantir de fato a concessão do direito.
Ficaram vencidas a relatora e os ministros
Maurício Godinho e Luiz Philippe Vieira de Mello Filho.
Abusividade da greve
Por 5 votos a 2, também foi afastada a abusividade da greve. Os ministros
concordam com a relatora de que os trabalhadores foram provocados pela empresa
a fazer greve, ante a retirada de praticamente "todos os direitos que
construíram ao longo da história".
Em seu voto, ela chamou a atenção para a
importância histórica do julgamento. Segundo ela, é a primeira vez que TST
julga o caso de uma empresa que praticamente retirou todas as cláusulas de
garantia dos trabalhadores.
De acordo com a ministra, houve "patente
conduta negacionista" dos Correios para tentar negociar o conflito, de
forma que a greve foi a única solução encontrada pelos trabalhadores. Ela
também apontou que não há qualquer demonstração de prejuízo para o ano seguinte
"fora mera alegação da empresa". Até agora, disse a ministra, "o
que temos visto é apenas lucro".
Ficaram vencidos apenas os ministros Ives
Gandra da Silva Martins Filho e Dora Maria da Costa.
No início deste mês, a relatora proibiu a
empresa de fazer cortes nos salários dos empregados. Na liminar, ela entendeu
que a atividade dos Correios, por ser serviço essencial, deveria ser mantida em
70% durante a greve. Hoje, a relatora destacou que à época da liminar, os
Correios já haviam efetuado desconto de imediato dos trabalhadores, conduta
proibida por lei.
Não participou do julgamento a presidente do
tribunal, ministra Cristina Peduzzi, que foi diagnosticada com Covid-19 na
última semana, e o ministro Guilherme Caputo, por impedimento.
Para a advogada Adriene Hassen, do escritório Cezar Britto &
Advogados Associados e que atuou pela Associação dos Profissionais dos
Correios,
a conduta antinegocial demonstrada pela empresa ao longo dos últimos
três anos "venceu e convenceu a maioria do TST".
"Os empregados dos Correios, que operam
na linha de frente nessa pandemia, além de sofrerem com o aumento do seu plano
de saúde, terão cerca de 30% de sua remuneração diminuída! Lembrando que a
categoria possui dos menores salários dentre as estatais, uma média de R$1,8
mil. Triste decisão. Ao longo de décadas de negociação coletiva os
trabalhadores trocaram reajuste salarial por concessão de benefícios que ora
foram retirados, se vendo, então, agora, sem um ou outro!", diz a
advogada.
Quanto custa enviar uma carta?
Correio Braziliense
21/09/2020
No Brasil, se o caminho da privatização for seguido, não será
diferente. E, como o território é muito maior, o preço também poderá ser,
onerando todos os brasileiros desnecessariamente. Os brasileiros não precisam,
não merecem e nem deveriam pagar essa conta
Marcos César Alves Silva*
A carta é um meio de comunicação universal
presente em todos os países do mundo e cada país estabelece o valor da
respectiva tarifa em seu território.
No Brasil, apesar de termos o 4º ou 5º maior
território do mundo, praticamos uma das menores tarifas de cartas.
Com exceção da Rússia, que tem o maior
território dentre todos os países e pratica uma tarifa de carta inferior à do
Brasil, todos os demais países que cobram menos para entregar suas cartas
possuem áreas bem menores que o Brasil.
Dentre os quase 200 países, o Brasil fica em
16º lugar, com sua tarifa de cartas custando 58% da praticada em Portugal e 39%
da praticada na Alemanha.
O quadro a seguir detalha essas informações
sobre Brasil, Portugal e Alemanha:
– Brasil – preço carta: US$ 0,3661 –
território: 8.510.295 km2
– Portugal – preço carta: US$ 0,6262 – território: 92.152 km2
– Alemanha – preço carta: US$ 0,9452 – território: 356.733 km2
fontes: UPU e Wikipedia
Uma das argumentações usualmente utilizadas
para justificar a intenção de privatização dos Correios ou a quebra do
monopólio postal é diminuir os valores cobrados pelos serviços. Todos os
exemplos de correios privatizados mostram o contrário: após a privatização ou
pouco antes dessa, os preços postais são substancialmente elevados e ficam
assim para o futuro.
No Brasil, se o caminho da privatização for
seguido, não será diferente. E, como o território é muito maior, o preço também
poderá ser, onerando todos os brasileiros desnecessariamente.
Os brasileiros não precisam, não merecem e
nem deveriam pagar essa conta.
*Marcos César Alves Silva – Vice-presidente da Associação dos Profissionais dos Correios (ADCAP)
Direção Nacional da ADCAP.
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