Postalis desiste de ação bilionária nos EUA
O Globo
22/03/2018
O Globo
22/03/2018
Nomeado pela Superintendência Nacional de
Previdência Complementar (Previc) para intervir no fundo de pensão dos
carteiros, Walter de Carvalho Parente, já pediu a renovação da intervenção no
Postalis e mandou suspender uma ação bilionária que poderia resolver a maior
parte dos problemas da instituição, segundo fontes e documentos aos quais O
GLOBO teve acesso. Ele ordenou aos advogados do fundo nos Estados Unidos que
não seguissem adiante com um processo determinado pela diretoria que foi
destituída no ano passado, depois da intervenção.
Tudo estava pronto para pedir um
ressarcimento de US$ 1,5 bilhão na Justiça americana ao banco BNY Mellon por
perdas causadas por fraude e má gestão no Postalis. Procurado, o presidente dos
Correios, Guilherme Campos, afirmou que, se o fundo de
previdência não reivindicar esse dinheiro, a própria estatal o fará.
- Tem de perguntar para a Previc o motivo de
abrir mão de US$ 1,5 bilhão. Nossa obrigação é ir atrás desse dinheiro - disse
o presidente dos Correios.
Ao ser questionado, Parente informou, por
meio da assessoria de imprensa do Postalis que nunca tratou sobre a suspensão
do processo com os advogados. No entanto, após O GLOBO afirmar que teve acesso
a um e-mail de um funcionário endereçado ao escritório de advocacia encarregado
da cobrança nos EUA e com cópia para o interventor, ele voltou atrás.
O e-mail diz que “por ordem do Sr. Walter
Parente, informamos que a Previc não aprovou o encaminhamento da carta de
autorização do Postalis para o seu escritório”. E fala ainda que “por ordem do
Sr. Walter Parente, nenhum processo pode ser aberto nos Estados Unidos sem a
autorização expressa do Postalis”.
Após negar oficialmente, por e-mail, que a
decisão não tinha sido tomada e depois informar que o assunto nunca tinha sido tratado,
o Postalis enviou ao GLOBO outra resposta. Disse que os advogados americanos
fizeram uma exigência de assinatura de um aditivo ao contrato já pactuado de
US$ 1 milhão para ingressar com a ação, o que não teria sido aceito pelo
interventor. Disse que “o ingresso ou não” de ação contra o BNY Mellon ainda
está em “processo de análise”.
O Postalis já pagou pelos serviços do
escritório americano, que entraria no próximo mês com a ação na Justiça. Nos
bastidores, o interventor tem dito a interlocutores que tem suspeitas em
relação ao escritório. No entanto, em vez de trocar de advogados, decidiu que
não deve tocar o processo com uma outra firma.
De acordo com fontes da Previc, a orientação
é focar apenas numa disputa na Justiça brasileira. Ele quer entrar como parte
numa ação do Ministério Público de São Paulo que pede R$ 9 bilhões de
indenização ao banco americano.
Em dezembro o interventor chegou a contar
numa reunião do Conselho de Administração dos Correios que recebeu oferta de
propina do banco americano para fechar um acordo com a instituição. Como a
revelação foi considerada bombástica, os executivos da estatal resolveram
deixar a denúncia registrada na ata do encontro.
“(O interventor) menciona gravidade da
situação enfrentada, citando inclusive ter recebido uma oferta de pagamento de
R$ 6 milhões, por parte de advogados representantes do fundo BNY Mellon, para
aceitar proposta de fechamento de acordo com aquela instituição, no valor de R$
1,2 bilhão, fato este comunicado de imediato à Previc”, diz o documento
assinado por todo o conselho de administração dos Correios.
Na ocasião, o BNY Mellon negou veementemente
a história. Por meio de nota, disse que a instituição jamais tratou assuntos
relacionados a um potencial acordo com o interventor e nem seus advogados.
Em seguida, o interventor do Postalis pediu
uma retificação da ata do conselho dos Correios. Parente pediu que se
registrasse que “de fato, foi procurado por advogado, que se dizia negociador
da dívida daquela instituição (Banco Mellon), mas que não se identificou como
representante do BNY Mellon.”. De acordo com um comunicado na página do fundos
dos carteiros na internet, o objetivo da solicitação foi corrigir a informação
anterior. A instituição afirma a notícia tinha “interpretações equivocadas
sobre o fato relatado”.
“Walter Parente reafirma a ocorrência do fato
e esclarece que, em momento algum, disse que o advogado que lhe oferecera
vantagem indevida era representante do Banco BNY Mellon. O que ele relatou foi
que o advogado se dizia pertencente a um escritório que intermediaria a
negociação entre o Postalis e o banco americano”, disse o fundo numa nota na
época.
Há um mês, os advogados americanos estiveram
com Walter Parente. De acordo com uma fonte ouvida pelo GLOBO, a ordem de não seguir
com o processo foi dada sem nenhuma explicação adicional. Ele teria ainda
pedido um relatório de tudo o que o escritório já fez. - Não há argumento para
desistir dessa ação - disse uma fonte do Postalis a par dos bastidores.
Antes da intervenção da Previc, o fundo de
pensão dos carteiros já havia conseguido bloquear na Justiça mais de R$ 300
milhões por causa de uma ação sobre fraudes em aplicações em títulos da
Venezuela. A instituição financeira é acusada de gerir de forma ruinosa o
dinheiro dos aposentados dos Correios.
A Justiça entendeu, na ocasião, que a
instituição teria condições de evitar a fraude. Num dos casos, o fundo de
investimento Brasil Sovereing II _ do Postalis _ tinha de aplicar 80% dos
recursos em títulos da dívida externa brasileira. Em 2011, entretanto, esses
papéis foram trocados por bônus argentinos e venezuelanos. O negócio resultou
numa perda de R$ 190 milhões.
Essa troca foi _segundo os investigadores _
feita pela ex-gestora Atlântica. O BNY Mellon, que administra o fundo, negou
qualquer envolvimento e alegou que as decisões de investimento cabem à gestora,
não à administradora.
O GLOBO procurou a Previc, órgão que nomeou
Parente como interventor, que não quis se manifestar. O BNY Mellon também não
se pronunciou.
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