segunda-feira, 7 de outubro de 2019


Cidadezinhas temem prejuízos com privatização dos Correios

O Tempo
06/10/19

Os Correios cresceram 6,06% em receita total no ano passado, em comparação com 2017. Na mira da privatização, a empresa é uma das poucas presentes em todos os 5.570 municípios brasileiros e, nos pequenos e de difícil acesso, é, muitas vezes, a única possibilidade de a população de acesso a serviços postal e bancário. O temor dessas cidades é que a venda comprometa o seu papel social.

Em São João das Missões, cidade mais pobre de Minas Gerais, localizada na região Norte, não há bancos, e a população depende do Banco Postal, marca dos Correios que permite, por exemplo, sacar dinheiro e pagar contas.

“Se ficarmos sem ele, vamos ter que fazer tudo (serviços de banco) nas cidades vizinhas Itacarambi, a 25 km, e Manga, a 21 km. E a população não tem condição de ir para outras cidades”, diz o secretário de Desenvolvimento Social do município, Joarez Rodrigues de Sousa, ressaltando que metade dos cerca de 12 mil habitantes sobrevive com auxílios, como o Bolsa Família.

Segundo Sousa, 90% das entregas de encomendas na cidade são feitas pelos Correios. “Eu acredito que, se privatizar, corremos o risco de perder a agência, e, se isso acontecer, será um retrocesso muito grande. Temos poucos recursos, e, se perdermos os Correios, vai ficar muito difícil”, completa ele.

Com menos de 4.000 habitantes, Ewbank da Câmara, na Zona da Mata mineira, perdeu o Banco Postal no ano passado. Agora, a população vai resolver as pendências na cidade vizinha Santos Dumont. “A gente perde receita, porque, quando o povo vai para outra cidade, gasta no comércio de lá”, afirma a secretária municipal de Administração, Maria Regina de Oliveira.

No município menos populoso do país, Serra da Saudade, no Centro-Oeste de Minas, onde vivem menos de 800 pessoas, os Correios são responsáveis pela entrega de correspondências e de compras feitas online. “O que temos ouvido é que, com a privatização, os Correios devem se organizar para o serviço de entregas com envios menos frequentes e em dias predeterminados”, diz a prefeitura.

No mês passado, o secretário especial de Desestatização do Ministério da Economia, Salim Mattar, disse a O TEMPO que oito grandes grupos empresariais estariam interessados nos Correios e que o ativo será “bem gerido na mão da iniciativa privada”.

O vice-presidente da Associação dos Profissionais dos Correios (Adcap), Marcos César Alves Silva, discorda. Para ele, os Correios têm uma boa estrutura no Brasil e um papel social importante: “Em muitas cidades só tem prefeitura, igreja e Correios. Apenas em 324 municípios as unidades são lucrativas; nas demais, se gasta mais do que se arrecada, mas esta é uma realidade que os Correios já conhecem. Nunca deixamos de atender comunidades”, destaca Silva.

Segundo ele, a privatização poderia comprometer o papel social, causando aumento de preço e fechamento de agências. “Imagina se a empresa privada vai pegar barco para levar duas caixinhas de encomenda para o interior do Amazonas”, diz.

Municípios pequenos podem sofrer
O coordenador do curso de economia do Ibmec-BH, Márcio Salvato, destaca que a privatização torna a qualidade do serviço melhor e reduz o custo, mas reconhece que cidades pequenas podem ser prejudicadas com a venda dos Correios.

“Todo processo de privatização pode levar à reestruturação. O ganho de eficiência que a empresa vai buscar pode modificar a logística, como juntar postos de duas cidades muito próximas”, diz Salvato.

Ao vender a estatal, o governo pode estabelecer regras à empresa compradora como, por exemplo, a necessidade de manter o Banco Postal.

Em nota, os Correios afirmam que conectam pessoas, instituições e negócios por meio de soluções “acessíveis, confiáveis e competitivas”. A empresa não comentou a possibilidade de privatização.

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