A responsabilidade dos fundos de investimentos na gestão dos recursos de fundos de pensão
Estadão
Ana Paula Oriola De Raeffray e Danilo Ribeiro Miranda Martins*
Ana Paula Oriola De Raeffray e Danilo Ribeiro Miranda Martins*
10 Setembro 2018
A reforma da previdência social no Brasil
depende do fortalecimento do regime de previdência complementar. Não há como
levar a cabo qualquer reforma que se pretenda que tenha algum sucesso, sem que
seja diversificada a base que possibilita a cobertura previdenciária, tão
reclamada pela sociedade.
A previdência complementar, principalmente a
fechada, está tentando superar a grave crise que a tem atacado, em especial a
de imagem, diante das denúncias em face de gestores de entidades fechadas de
previdência complementar que administram planos de benefícios patrocinados por
empresas controladas pelo Estado.
Tais denúncias tem por objeto, de uma forma
geral, a malversação das reservas garantidores dos planos de benefícios,
mediante investimentos considerados de risco, realizados em grande parte por
meio de fundos de investimento.
Os participantes dos planos de previdência
complementar (não apenas os administrados pelas entidades fechadas) quando
realizam as suas contribuições podem acreditar que ela será administrada
diretamente pela entidade de previdência complementar.Mas os gestores das entidades
de previdência complementar se valem dos instrumentos financeiros necessários,
e que lhe são permitidos normativamente, para realizar os investimentos das
reservas formadas pelas contribuições das partes que integram o contrato de
previdência (plano de benefícios) que administram.
A maioria destes investimentos tem como
veículos os fundos de investimento, estruturados pelas instituições financeiras
para investidores qualificados como as entidades de previdência complementar.
Também a maioria das fraudes que são objeto de apuração na gestão dos ativos
das entidades fechadas de previdência complementar envolve justamente a
estruturação desses fundos de investimento, que se valem de diversos atores.
As empresas que integram a estrutura dos
fundos de investimento são contratadas pela entidade de previdência
complementar, que passa a ter a condição de cotista do fundo de investimento. A
estrutura mínima de um fundo de investimento compreende: o administrador, o
gestor, o custodiante, o distribuidor e o auditor.
Muito embora não integre diretamente a
estrutura do fundo de investimento, também possui importância a
responsabilidade a agência de rating, responsável por avaliar os riscos
envolvidos em um determinado investimento. No fundo de investimento é a agência
de rating que indica, por exemplo, se o crédito adquirido pelo cotista –
entidade de previdência complementar – é sólido ou não.
As investigações que tem por objeto os
investimentos das entidades fechadas de previdência complementar – deflagradas
pela Polícia Federal em conjunto com o Ministério Público Federal e a PREVIC –
Superintendência Nacional de Previdência Complementar – têm indicado que as
potenciais fraudes se encontram, em parte, na estruturação dos fundos de
investimento.
Ocorre que tais investigações se concentram
nos gestores das entidades de previdência complementar e acabam por não
alcançar todos os atores que integram a estrutura do fundo de investimento.
Não há dúvida de que a entidade, na qualidade
de cotista do fundo de investimento,tem o direito de exigir que os atores que
corporificam o fundo investimento assumam suas respectivas responsabilidades
pelos danos financeiros que causarem aos planos de benefícios, a qual poderá,
inclusive, ser solidária em algumas situações.
E esta responsabilidade paulatinamente está
chegando à apreciação do Poder Judiciário, gerando, assim, o reconhecimento e a
delimitação das responsabilidades dos atores que pertencem à estrutura dos
fundos de investimento. Em decisão de 2017, tais responsabilidades restaram bem
indicadas na sentença proferida na ação de perdas e danos movidas pelo Fundo de
Investimento em Direitos Creditórios Trendbank Banco de Fomento – Multisetorial
em face de todas as instituições financeiras que o estruturaram.
Extrai-se dessa decisão uma primeira
delimitação sobre a responsabilidade de cada um dos agentes, bem como o
reconhecimento de que nessa espécie de relação jurídica estabelecida entre os
atores dos fundos de investimento é inaplicável o CDC – Código de Defesa do
Consumidor, tendo em vista a qualificação de todos os envolvidos.
A principal conclusão, desse modo, é que a
apuração da responsabilidade civil dependeria da comprovação de culpa ou dolo
dos envolvidos, na medida em que se entende que a entidade fechada de
previdência constitui um investidor qualificado, apto a avaliar os riscos
envolvidos nas aplicações financeiras, não podendo ser considerada
hipossuficiente nessa relação.
Por essa razão, temos como um avanço a Resolução
CNM nº 4.661/2018, ao aumentar o rigor relativo ao acompanhamento e avaliação
dos prestadores de serviço, o que certamente contribuirá para a configuração da
culpa dos gestores terceirizados, quando configurado prejuízo para os planos de
benefícios, apta a gerar responsabilização na órbita civil, penal e
administrativa.
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