quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Entenda por que o comitê organizador da Rio- 16 agora precisa de recursos públicos

Estadão
16/08/2016
A Prefeitura do Rio anunciou nesta segunda-feira (15) que vai repassar recursos para o Comitê Rio 2016. O prefeito Eduardo Paes (PMDB) afirmou que o dinheiro servirá para viabilizar a Paraolimpíada, que acontece em setembro. 
Nas últimas semanas, os organizadores insistiram em dizer que não usariam verbas públicas para os Jogos. Entenda por que o comitê organizador precisa dessa ajuda financeira e por que ela está sendo dada quando a Olimpíada já está em andamento.

Por que o comitê organizador precisa de recursos públicos?
O comitê organizador Rio-2016, responsável pela operação da Olimpíada e Paraolimpíada, não conseguiu financiar os eventos apenas com recursos privados. A entidade recebe dinheiro do COI (Comitê Olímpico Internacional), de patrocinadores mundiais e locais dos eventos, venda de ingressos, licenciamento de produtos, entre outras receitas. 
Elas não foram suficientes para bancar a operação da Olimpíada e Paraolimpíada. O comitê é o responsável pela alimentação e transporte dos atletas, hospedagem, atendimento da imprensa, público, realização das cerimônias de abertura e encerramento, entre outros serviços operacionais. 
Qual o orçamento do comitê?
De acordo com a última informação divulgada, no ano passado, as despesas do comitê organizador Rio-2016 estão estimadas em R$ 7,4 bilhões. Esses dados foram divulgados antes dos cortes de gastos realizados pela entidade. Inicialmente, afirmou-se que as economias tinham como objetivo não superar esse valor. Contudo, o comitê precisou fazer gastos emergenciais na reta final da preparação –como os reparos na Vila Olímpica, que custaram cerca de R$ 20 milhões – e não se sabe qual o orçamento final. 
Qual o déficit do comitê organizador?
Não há valor oficial, até porque o cálculo final depende de algumas variáveis, como a venda de ingressos ainda em curso. Estimativas indicam que serão necessários R$ 270 milhões para ajudar o comitê organizador a fechar as contas. 
O comitê errou ao gerar déficit na operação dos eventos?
Não é possível saber, já que há poucas informações sobre contratos e salários da entidade. A crise econômica afetou pouco os patrocínios, pois a maioria dos contratos foram assinados antes de 2014. Mas ela pode ter reduzido a procura por tíquetes por parte do público. 
De acordo com a Latam Viagens, operadora que vende com exclusividade os pacotes de hospitalidade, afirmou que "o nível de confiança do consumidor foi afetado em função das incertezas do cenário econômico do país. Este comportamento de compra do consumidor reflete em diversos setores e não foi diferente com a Olimpíada. A operadora sentiu o consumidor mais cauteloso para fechar um pacote para acompanhar os Jogos". 
A ajuda anunciada pela Prefeitura do Rio é a primeira a ser feita?
Não. Ao longo de toda a preparação, os governos federal e municipal se responsabilizaram por serviços que, inicialmente, eram responsabilidade do comitê organizador. A União assumiu a segurança interna das arenas, com agentes da Força Nacional. Comprou também equipamentos esportivos. A Prefeitura do Rio cedeu garis para fazer a limpeza dos estádios. Tudo isso livrou o comitê de realizar mais gastos. 
Além disso, o governo do Estado também fez um programa de incentivo fiscais em que empresas repassaram cerca de R$ 350 milhões ao comitê. 
O rombo é culpa da Paraolímpiada?
Não. O orçamento do comitê organizador é único para Olimpíada e Paraolimpíada. Sabia-se desde o início que o segundo tem menos procura e não se sustenta sozinho. Em todas as edições dos Jogos, a Paraolimpíada é mantida com recursos arrecadados na Olimpíada. A primeira justificativa dada para a ajuda era as cerimônias de abertura e encerramento dos dois eventos. Nos dois casos, são argumentos para sensibilizar a opinião pública. No caso da Paraolimpíada, ela é afetada porque é o último evento a ser realizado –quando o caixa já estará combalido. Mas sempre se soube que ela precisaria de apoio dos recursos dos Jogos principais para se pagar. 
O déficit já era esperado?
No dossiê de candidatura do Rio, entregue ao COI em 2009 quando a cidade disputava sediar o evento, previa-se que um quarto da receita do comitê organizador viria de recursos públicos. Contudo, depois decidiu-se que o comitê não receberia recursos diretos dos governos.
 
Apesar disso, o COI exigiu que o poder público desse garantias de que cobriria um eventual déficit do comitê organizador A lei do Ato Olímpico autorizou a União a cobrir esse rombo –o que foi revogado no ano passado. Estado e Prefeitura do Rio também deram essa garantia. 
Por que os recursos não foram repassados antes?
Dois fatores contribuíram para a necessidade de repasse emergencial durante o evento. O principal é a crise econômica e a dificuldade política e financeira em usar verba pública para a operação do comitê.
Outro motivo é a tentativa do comitê organizador de fugir da fiscalização de órgãos de controle, como o TCU (Tribunal de Contas da União). 
Os gastos do comitê são fiscalizados?
Atualmente, nenhum órgão de controle faz a fiscalização dos gastos do comitê. O TCU tem instaurado um processo de 2014 em que recebeu sob sigilo planilha de gastos com salários e serviços da Rio-2016. 
A análise, porém, foi suspensa após ser retirada da lei do Ato Olímpico a previsão de cobertura de déficit por parte do governo federal –motivo legal para a abertura do processo. A mudança foi um pedido do próprio comitê, incomodado com a auditoria do TCU. 
Embora a garantia de cobertura ainda exista por parte do Estado e município, nem TCE (Tribunal de Contas do Estado) nem TCM (Tribunal de Contas do Município) têm processos para fiscalizar o comitê. A Justiça Federal exigiu que o comitê apresente detalhamento de receitas e despesas, após ação proposta pelo MPF (Ministério Público Federal). 
Por que não é fiscalizado, se o comitê já recebeu ajuda dos governos?
A ajuda recebida pelo comitê organizador veio por meios que fogem da fiscalização. A interpretação inicial do TCU e do MPF, órgãos mais atuantes nesse caso, é de que a fiscalização plena só pode ocorrer caso o comitê receba diretamente recursos do Tesouro. 
O primeiro apoio veio por meio de patrocínio dos Correios, de R$ 300 milhões, em 2014. Essa forma de repasse, a princípio, não prevê fiscalização. 
Quando a União assume serviços e compras do comitê, o TCU pode fiscalizar apenas essas compras específicas, feitas por órgãos do governo. Mas não as contas do comitê, já que a entidade não manejou essa verba. 
Os dois modelos, porém, são lentos. O governo só pode ser ágil agora caso decida fazer compras sem licitação –o que exigiria desgaste político. O patrocínio de empresas de economia mista, como a Petrobras, exige aprovação na diretoria num momento de crise econômica. 
Por este motivo, discute-se um convênio com a Prefeitura do Rio, ente que tem alguma disponibilidade de caixa no momento, e não tem fiscalização do TCU. Como dito anteriormente, apesar de ter instrumentos jurídicos, o TCM não analisa as contas do comitê. 
Como a previsão legal de cobertura por parte do governo federal foi retirada do Ato Olímpico, o TCU anda não concluiu se tem ou não instrumentos legais para fazer a fiscalização. O MPF afirma que o fato do governo federal ter assumido responsabilidades do comitê faz com que a entidade seja passível de fiscalização. 
Os comitês de Jogos anteriores precisaram de ajuda dos governos?
De acordo com o Comitê Rio 2016 e com o COI, a maioria das sedes contou com ajuda de recursos públicos para viabilizar os Jogos. 
Em uma entrevista coletiva pouco antes de a Olimpíada começar, o comitê de candidatura de Paris, por exemplo, também afirmou que a prefeitura da capital francesa colocará dinheiro, caso consiga vencer a concorrência. 

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