Crise dos Correios desagrada consumidores e funcionários desabafam: ‘A culpa não é do carteiro’
Extra
18/03/18
18/03/18
De goteiras a banheiros quebrados, passando
por carros danificados, falta de pessoal, assaltos frequentes e sequestros
rotineiros. Os problemas citados fazem parte do dia a dia de centenas de
funcionários dos Correios no estado do Rio. Na
última semana, o EXTRA ouviu as reclamações de dezenas de servidores que lidam
com as correspondências e encomendas, que hoje penam para chegar às casas dos
consumidores.
— O principal é dizer que a culpa da crise
dos Correios não é do carteiro. Uma rotina de trabalho dura mais de 10 horas
durante a semana. Ainda enfrentamos falta de segurança e de condições de
trabalho — disse um carteiro que pediu para ser identificado como W, pelo medo
de retaliação por parte da empresa.Nos Centros de Distribuição (CDDs)
espalhados pelo estado, o retrato é de abandono. Na Tijuca, os últimos meses no
espaço foram em meio a goteiras e poças nas salas de triagem. Na Barra da
Tijuca e no Recreio, as caixas com cartas e encomendas ficam espalhadas em
mesas e pelo chão, devido ao acúmulo de itens. Em Senador Camará, os
funcionários convivem com carros e caminhões desativados, enquanto em Realengo,
os banheiros estão interditados com problemas.
— Queremos condições justas de trabalho. A
empresa está com uma política de incentivar a saída de funcionários. Enquanto
isso, o acumulo de serviços é grande — disse Ronaldo Martins, presidente do
Sindicato dos Trabalhadores dos Correios do Rio de Janeiro
(Sintect-RJ).
Indenizações disparam
Uma auditoria feita pela Controladoria Geral
da União (CGU), no segundo semestre de 2017, mostrou o tamanho do problema
logístico vivido pelos Correios. Os técnicos do órgão constataram que em seis
anos, o volume de indenizações pagas pela empresa por atrasos, extravios e
roubos aumentaram 1.054%. Para se ter uma ideia, o peso financeiro, em 2011,
sobre essas indenizações foi de R$ 60 milhões. Já em 2016, o valor disparou a
R$ 201,7 milhões. O aumento percentual foi de 236% no período.É o caso, por
exemplo, da designer de joias Luciana Albuquerque, de 29. Ela depende dos Correios
para enviar seus produtos. Várias vezes, porém, o serviço se torna uma grande
dor de cabeça.
— Fiz uma postagem dia 8 de fevereiro e até
agora não chegou. Já foram três reclamações sem resposta. Vou ter que postar
outra produto e cobrar o que aconteceu com este — disse Luciana.
Outro dado encontrado pelo TCU aponta para o
congelamento no corpo funcional. De 2011 a 2016, aumento de 0,43%. A empresa,
porém, nega acumulo de trabalho, e aponta reestruturação diante da queda no
número de postagens.
Assaltos são rotineiros
O acúmulo de serviço só não é pior que a
insegurança para rodar com carros, caminhões ou até mesmo a pé. Entre os
funcionários dos Correios, a “disputa” é para saber quem foi o mais assaltado
nos últimos anos.
— Em quase 15 anos como carteiro no Rio de
Janeiro, já fui assaltado mais de 25 vezes. Além das entregas, levam o dinheiro
que temos, celular e o que for de valor. Já perdi três alianças. Só não largo o
meu emprego por causa da minha família — lamentou o funcionário D, que preferiu
o anonimato.
Segundo os servidores, os assaltos são comuns
em bairros da Zona Norte e da Zona Oeste.
— É comum o mesmo grupo de assaltantes
cometer o crime em mais de uma oportunidade. Alguns “reconhecem” o bando, mas
nada é feito — reforçou D.
Procurados, os Correio informaram que
analisam situações de entregas com escoltas ou recomenda a retirada do produto
nos Centros de Distribuição. A empresa lembrou, porém, que o assunto é uma
questão de Estado. A respeito da situação dos Centros de Distribuição, o órgão
tem planos de investimentos em infraestrutura: “em função do tamanho da
empresa, problemas pontuais podem existir em algumas unidades”.
Depoimentos
Gabriela Siqueira, de 41 anos.
Dona da loja online “Casa da Gabriela”
‘Enviei um item antes do Natal, mas ele
chegou em fevereiro’
Tenho uma loja online de crochê e a maioria
das encomendas é enviada pelos Correios. Dependo deles de certa forma. Um caso
que aconteceu comigo no passado me chocou. Recebi uma encomenda em novembro,
com certa antecedência, pois o cliente gostaria de dar de presente para o
Natal. A encomenda era para fora do estado. Fiquei acompanhando o rastreamento,
mas sem atualização. O Natal passou, a encomenda não chegou e a gente fica sem
saber o que dizer para quem comprou o produto. O item só foi chegar em
fevereiro, quase três meses depois da postagem.
Eu me coloquei à disposição da pessoa para
enviar um novo produto, mas ela aceitou ficar com o que chegou. Mas é algo
ruim. Eu não tenho outra opção se não mandar pelos Correios. Para tornar minha
situação ainda mais delicada, meus produtos são feitos à mão, e possuem
características próprias. Se já existe o temor quando o transporte é feito de
maneira correta, imagina quando não temos ideia do que acontece no caminho até
o cliente.
Luciana Albuquerque, de 29 anos.
Sócia do Studio Manual e designer de joias
‘Os problemas não são poucos, mas podem ser
solucionados’
Como empresária, recorro diversas vezes ao
serviço dos Correios e reconheço a importância da empresa enquanto empresa
pública, porém o que mais tenho são histórias de problemas. Um caso, por
exemplo, foi um pedido que recebemos no dia 6 de fevereiro e postado no dia 8.
Já passamos da metade de março e até agora ele não chegou. O código de
rastreamento fala que ele está a caminho, mas não diz exatamente em qual local.
Já foram abertos três protocolos de reclamação, mas não tivemos retorno. Já
liguei para o atendimento para tratar com algum responsável e não consigo. O
jeito será enviar outro produto e resolver depois. Esse atraso já aconteceu
outras vezes, às vezes somos informadas que o item foi roubado e recebemos o
estorno.
Existem outras casos, mas a responsabilidade
não é só dos Correios. Como a questão da Segurança, por exemplo. Os problemas
não são poucos, mas podem ser solucionados se houvesse uma melhor gestão e
vontade política. Uma pena é que parece haver um movimento do governo no
sentido de sucatear o serviço.
Nenhum comentário:
Postar um comentário