Má governança leva Previc a intervir no
Postalis
VALOR ECONôMICO
5/10/17
O histórico de má governança do Postalis, fundo de pensão dos Correios,
e episódios recentes relacionados a investimentos malsucedidos motivaram a
Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) a determinar,
ontem, a intervenção na fundação, apurou o Valor. O regulador, criticado no
passado recente pela postura omissa em meio a denúncias de fraudes e corrupção
em algumas entidades, quer estabelecer uma postura rígida sobre o setor.
A intervenção inclui a abertura de uma comissão de inquérito que vai investigar
potenciais irregularidades na fundação, com duração mínima de 120 dias. Com a
medida, os bens dos diretores e conselheiros atuais e os que ocuparam assentos
na fundação nos últimos 12 meses serão bloqueados até que essa comissão seja
concluída. Na sequência, o colegiado da Previc deverá julgar estes dirigentes.
As penalidades vão de multa máxima de R$ 40 mil por infração e inabilitação por
até dez anos.
A autarquia não deu detalhes sobre a intervenção e limitou-se a informar que se
deu, "em especial, por descumprimento de normas relacionadas à
contabilização de reservas técnicas e aplicação de recursos". Fontes com
conhecimento do assunto disseram que a decisão do Postalis de terceirizar a
gestão de créditos podres que já tinham sido baixados para prejuízo também foi
levada em conta pelo regulador.
Em 2016, a fundação transferiu bilhões de créditos podres de seus dois planos
para fundos de direitos creditórios e contratou as gestoras Jive, Novero e
Cadence para geri-los. O objetivo era tentar recuperar pelo menos parcialmente
o dinheiro investido, principalmente por meio da cobrança de garantias. A
operação, segundo uma fonte, não está prevista na resolução 3.792, que
regulamenta os investimentos dos fundos de pensão.
O conselho deliberativo da fundação, que tem patrimônio de R$ 10,3 bilhões, 117
mil ativos e mais de 26 mil assistidos, rejeitou as contas do plano de
benefício definido (BD) em 2016, que teve déficit de R$ 1,1 bilhão. Outro
plano, o Postalprev, de contribuição variável e que registrou superávit de R$
84,7 milhões no ano passado, teve as contas aprovadas com ressalvas da
auditoria. Em meados deste ano, a Previc chegou a interferir na decisão dos
Correios em relação a representantes indicados pela própria empresa na
fundação, o que também teria pesado na decisão pela intervenção. Fontes ligadas
ao Postalis dizem que a patrocinadora queria destituir membros dos conselhos
fiscal e deliberativo antes do final do mandato, o que é proibido pelo estatuto
da entidade. A Previc, então, determinou que fossem recolocados. O Postalis acumula
denúncias de má gestão, corrupção e fraudes de dirigentes que levaram ao rombo
em seu patrimônio. Também foi um dos alvos da Operação Greenfield em setembro
de 2016, que apurou desvios de recursos nas principais fundações.
O interventor nomeado pela Previc foi Walter Parente, auditor fiscal experiente
no assunto. Atualmente, é liquidante do Aerus, fundo de pensão da Varig, e foi
administrador especial com poderes de intervenção em alguns planos de
benefícios da Petros, fundação da Petrobras. Ele também foi interventor do
Serpros, fundo de pensão multipatrocinado da Serpro, empresa de processamento
de dados vinculada ao Ministério da Fazenda. O Postalis disse em nota que
Parente reuniu-se ontem com gestores das áreas técnicas para determinar as
novas diretrizes.
O presidente da Associação Brasileira de Entidades Fechadas de Previdência
Complementar (Abrapp), Luís Ricardo Martins, disse que a Previc tem exercido um
papel importante com medidas como a supervisão baseada em risco e a adoção de
critérios mais rígidos para fundações de maior porte, chamadas de Entidades
Sistemicamente Importantes (ESI) - são 17 sob esta nova régua, incluindo o
Postalis. "A Previc está muito atenta a isso, se tomou esta medida, é uma
exceção [...]. Isso não tem que ser visto como assustador ou o fim do mundo.
Acontece em qualquer segmento", disse no congresso da entidade em São
Paulo.
Presente no evento, o diretor-superintendente substituto da Previc, Fábio
Coelho, não comentou o assunto. Em entrevista ao Valor esta semana, ele afirmou
que não descartaria tomar "ações mais enérgicas de curto prazo para
endereçar riscos isolados". Questionado sobre a intervenção no Postalis, o
secretário de coordenação e governança das empresas estatais, Fernando Soares,
disse ontem que o governo não tem como interferir diretamente na administração
de fundos de pensão. "Não posso atuar diretamente no fundo de
pensão", afirmou o secretário, ressaltando que sua secretaria atua na
empresa. "Estamos trabalhando para melhorar a governança das estatais em
relação à gestão do fundo", destacou.
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